Fui descobrindo Cida aos poucos. A primeira descoberta fiz olhando direto para seus olhos sempre vermelhos ao fim das visitas. Lembro de pensar que ela não se adaptaria à realidade da fila (e quem se adapta?). E foram os olhos vermelhos que me mostraram Cida. Sempre muito elegante, cabelos impecavelmente alisados com chapinha, roupas coordenadas, sandálias altas de plataforma e algum brilho que não chega a ofuscar. A última descoberta que fiz sobre Cida foram suas unhas inacreditavelmente grandes, bem cuidadas e decoradas. Cida pinta as unhas como se fossem telas. Nela desenha pássaros, flores e borboletas coloridas. Cida tem um jardim nas pontas dos dedos.
Uns trinta e poucos anos. Quinzenalmente viaja quase trezentos quilômetros para ver seu homem na cadeia. Tenta desesperadamente a transferência dele para um presídio próximo, mas não há vagas por lá. Ela fala da esperança de conseguir a vaga. Pergunto se tem filhos. Não tem. Não teve tempo. Conheceu-o numa festa dois meses antes dele ser preso. Estavam apaixonados. Era o homem da vida dela. E a prisão veio nesse momento de descoberta. A família dele é de Minas. Ele não tem ninguém por aqui e ela não podia deixar -lo abandonado. Fez em cartório um documento de união estável para poder visitá-lo, viaja quilômetros, se enfeita, gasta todo o parco rendimento do trabalho no salão de beleza com advogado e passagens.
Pergunto como ela pode ter certeza de que esse amor tão novo vale tanto sacrifício e ela me responde, me olhando com seus olhos vermelhos de choro, que não tem. Em sua resposta sinto um peso de destino, um pouco de entrega e muito de esperança. Não sei em qual proporção a mistura destino, entrega e esperança age sobre Cida. Digo que ele é um cara de sorte. Ela sorri e reticencia o sorriso com os ombros. E segue na fila.
Te Invito
Há 7 anos